quinta-feira, 23 de julho de 2009

A LEGITIMAÇÃO DA PROPRIEDADE: SER PROPRIETÁRIO É UM DIREITO NATURAL

A LEGITIMAÇÃO DA PROPRIEDADE: SER PROPRIETÁRIO É UM DIREITO NATURAL

Afonso de Sousa Cavalcanti – professor da Fundação Faculdade de Fil., Ciências e Letras de Mandaguari, Paraná.

Introdução. O ser humano recebeu do Criador os poderes da força, da beleza e da eloqüência. Através deles procriou e organizou o processo da civilização. Ter ou ser são dois atributos fundamentais que podem ou não ser visualizados pela população mundial. No aspecto do ter faremos referência ao domínio da propriedade da terra e ao seu uso devido. No tratado do ser observaremos as ações de racionalidade e de irracionalidade com o objetivo de refletir sobre as ocasiões em que os proprietários da terra consideram a terra com um bem natural para todos ou simplesmente a acolhem como um bem de negócio e de exploração.
O status social e a felicidade do proprietário. A apropriação legítima garante liberdade ao trabalhador proprietário, que pode, por seu próprio esforço, tornar-se um empreendedor. Aquele que se torna empreendedor liberta-se das possibilidades da expropriação e da exploração capitalistas. Esta ilustração na sua forma mais precisa vem dos economistas clássicos dos séculos XVII ao XIX. Se estes tinham razão em afirmar isso, então, os posseiros têm razão em invadir as áreas que ainda não são colonizadas ou trabalhadas (as terras devolutas e improdutivas).
A legitimação da posse da propriedade vem através do trabalho. Segundo John Locke, “Deus deu o mundo a Adão e sua posteridade em comum”. No Planeta Terra há espaço suficiente para que todos os homens possam produzir. A terra é propriedade de todos os homens. É através do trabalho que Locke determina a posse da terra (LOCKE, 1991; CAVALCANTI, 2001). Apropriar-se da terra, somente se torna legítimo se o homem o fizer através do trabalho. Os escravos negros, os agregados e os imigrantes contribuíram duramente com o trabalho da terra e a eles não foi conferida uma política justa e merecedora dos frutos de seu trabalho. Se os proprietários tiverem a terra simplesmente com a intenção de usar o seu valor econômico, como de fato representa a sua escritura pública, então tais proprietários podem ser taxados de usuários da terra para negócio e exploração.
A propriedade da terra, segundo John Locke, somente se consolida a partir de sua posse, através do trabalho. Enquanto o homem não modificar o espaço com seu trabalho ou projetar nele modificações, então não haverá ali posse, o apropriar-se propriamente dito.
Para Locke, um homem e sua família apenas necessitam de uma porção de terra para garantir seu sustento. A propriedade tem mais valor na medida em que sobre ela é aplicado mais trabalho. É através do trabalho que os homens se apropriam dos bens da natureza. É pelo trabalho que se determina a “extensão de terra que um homem lavra, planta, melhora, cultiva, cujos produtos usa, constitui a sua propriedade. Pelo trabalho, por assim dizer, separa-a do comum ”(LOCKE, 2001). As propriedades privadas surgiram a partir do trabalho sobre os materiais existentes. A extensão da propriedade teve sua origem a partir da força de trabalho que era empregada sobre ela. O que é excedente à força de trabalho, passa a ser propriedade de terceiros.
São diversos os meios existentes para que consiga o domínio da propriedade da terra. Se as pessoas se apropriam da propriedade através do trabalho, então as propriedades produtivas serão tidas como bens privados de seus produtores e não haverá lugar para idéias contrárias. Locke defendeu que se houver a posse da propriedade, apenas através das forças do trabalho, não haverá ocasião para o estado de guerra. Antes de haver a organização do trabalho, ninguém era dono de nada.
Tudo pertencia a todos e desta forma
Nenhum trabalho do homem podia tudo dominar ou de tudo apropriar-se, nem a fruição consumir mais do que uma pequena parte, de sorte que era impossível para qualquer homem, dessa maneira, usurpar o direito de outro ou adquirir para si uma propriedade com prejuízo do vizinho (LOCKE, 1991).
De acordo com o investimento, através do trabalho, os bens privados aumentam seu valor. Mais de dois terços da humanidade não sabe usar de sua força de trabalho. O estado pacífico não existe porque o trabalho não é racionalmente utilizado. O uso racional consiste em usar bem, em apenas se apossar do que é necessário para progredir. Locke teorizou que se um selvagem ou qualquer outra criatura humana se apossar de mais objetos, além daqueles necessários, então estará se apossando de bens que pertencem a terceiros (LOCKE, 1991; CAVALCANTI, 2001). No momento em que os homens se apossam da terra para produzir, estes fazem aumentar as possibilidades de mais reservas à humanidade.
Os desentendimentos gerados em torno da propriedade particular podem ser resolvidos através do pacto de consentimentos dos homens. Se os homens nasceram iguais e se fizeram unidade através do pacto e da criação do Estado, esta unidade se consolida a partir do momento em que for estabelecida a sociedade política. Tal sociedade somente será reconhecida se a comunidade agir de acordo com normas estabelecidas em leis e todos os homens reconhecerem que suas decisões necessitam resolver as diferenças de todos os membros daquela sociedade.
A formação do povo como corpo político, com poder de decisão, originará o poder legislativo que fará as leis necessárias para conduzir a sociedade. a ganância e o mau uso dos bens que pertencem a todos representam a irracionalidade. A racionalidade garante a igualdade e a liberdade. A irracionalidade humana pode destruir o convívio social pacífico e quase sempre gera a escravidão. Mostraremos a seguir que os conflitos sociais pela posse da terra representam a escravidão.
A escravidão é o estado de guerra, o próprio exercício de exploração e de expropriação, em que o conquistador, o colonizador e todos aqueles que tiveram lucros exorbitantes, através dos negócios de terras, exercem sobre todos aqueles que se obrigam a ter que comprar sua terra e até mesmo a invadi-la, caso desejarem sobreviver.
Prerrogativas indispensáveis da sociedade civil. A sociedade civil organizada tem por prerrogativa garantir a liberdade e proteger a propriedade e ao mesmo tempo evitar os inconvenientes causados pelas forças dos mais fortes sobre os mais fracos. Entendemos que a sociedade civil tem por obrigação garantir a manutenção da vida, através do acesso ao bem natural que é a terra. O trabalhador do campo torna-se livre a partir do momento em que pode fazer uso da terra, quer como proprietário, meeiro, parceiro, arrendatário e outros meios que lhe garantam o sustento de si e dos seus. A liberdade está em poder fazer uso dos bens naturais que se somam à terra em condição de produção.

CONCLUSÃO
Partindo dos seguintes pressupostos:
a) a terra é um bem natural e está comprovado que não é utilizada racionalmente para os que dela necessitam e querem trabalhar para produzir, cabendo aos grupos sociais organizados apelarem na defesa da propriedade limitada pelo trabalho, ao mesmo tempo contra a propriedade ilimitada, ou seja, o latifúndio;
b) é através do trabalho que o homem determina a existência da posse da terra. Apropriar-se da terra somente se torna legítimo se o homem o fizer através do trabalho, embora possa ser auxiliado com o uso de tecnologias. O trabalho investido possibilita a transformação dos recursos em riquezas.
Seguindo o raciocínio de Locke, percebemos que, para ele, um homem e sua família necessitam apenas de uma porção de terra para garantir seu sustento. Quem sabe, um pequeno espaço correspondente a um módulo rural bem-sucedido. A propriedade tem mais valor na medida em que sobre ela é aplicado mais trabalho, mais técnica. Certamente, na discussão existente sobre o mau gerenciamento das propriedades rurais (transformando-as em latifúndios e minifúndios), é preciso repensar muito sobre o poder tecnológico (a infra-estrutura necessária) para produzir mais e produzir melhor. Esta é uma forma de distribuir renda. O latifúndio e o minifúndio precisam passar pelos olhares da legislação atual. O aumento do mau uso das propriedades brasileiras está fundamentado sim na falta de trabalho bem ordenado sobre elas. Os latifundiários utilizam-se das escrituras de suas terras para levantar recursos econômicos (dinheiro) a fim de comprar mais terra, ou ainda para investir em meios financeiros mais rentáveis. Os donos de pequenas propriedades improdutivas (minifúndios) não possuem meios para levantar recursos necessários junto de setores financeiros, de forma a ter folga para os seus empreendimentos. Sendo assim, a propriedade da terra deve atingir seu fim social. Por este fim entende-se: a moradia e o sustento da família que reside na propriedade. A família moradora deve transcender às dádivas da mãe natureza e sim cuidar dela com esmero e sensibilidade.

REFERÊNCIAS
CAVALCANTI, Afonso de Sousa. A política no confronto entre os pensamentos de Thomas Hobbes e John Locke: por uma ética política(a). 2. ed. Mandaguari: Arte Final Gráfica e Editora, 2001.
LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. Trad. De E. Jacy Monteiro. 5. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991.
MARTINS, José de Souza. Expropriação e violência. A questão Política no campo. 2 ed, São Paulo: Hucitec, 1982.

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